Boa
noite
Na
49º Edição da Barcaça agradece todos os nossos colaboradores e ao público que
ultrapassou as 10.000 entradas nestas viagens por este nosso rio.
Ao
longo deste nosso percurso com início em 25/08/202, uma palavra de
agradecimento a todos os colaboradores que partiram e dar as boas-vindas aos
que entraram, parar é morrer e a Barcaça amiga do ambiente vai vareando este
rio da mesma forma com que começou.
Nesta
edição e não fugindo ao alcance do seu barqueiro, analisa o dia a dia de
Portugal com as suas dificuldades as suas mudanças e percorre de uma forma
agradável os nossos Concelhos seja de Montemor-o-Velho como da Figueira da Foz.
Na monumentalidade do Concelho de Montemor-o-Velho, Mário Silva traz-nos "Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó".
Fernando Curado já nos habituou as belíssimas descrições de tempos idos das gentes e das ruas da Figueira da Foz, Carla sempre acutilante nas suas abordagens da vida fala-nos dos seus amores maiores. José Craveiro um contador de histórias impressionante. Olímpio Fernandes nas vestes do Repórter Mabor vai trilhando hoje os caminhos alcatroados da sua “Barca” recordando como tanto gosta dos candeeiros a petróleo e das suas raízes. Já António Girão desta vez uma crónica de viagem, (história de muito amor). Já na Poesia, com uma nova entrada Isabel Rama, depois Garça Real "Foi longa a caminhada.", Isabel Capinha (Velha, eu?) e com a entrada de mais uma Isabel, desta vez Isabel Rama que desde já agradeço o seu contributo para valorização das viagens da Barcaça. A Poetiza Isabel Tavares (Para Lá Dos Sonhos) “...há um mundo de magia...”, Mara Kopke o seu “Refúgio” “...Até que o silêncio entorne a minha alma...”
A
minha escolha na rúbrica dos livros vai para Manuel Alegre “Memórias Minhas”.
Já a escolha de Ary dos Santos, “Estrela da Tarde” termina esta nossa viagem da
Edição 49º
Boas
Leituras.
Portugal
a "ferro e fogo".
Este
final de mês ficou bem assinalado que o Estado não está a cumprir com a sua
missão “defender todos os portugueses”.
As
causas poderão ser mais que muitas, mas não nos podemos deixar confundir com a
comunicação social que só procura abertura de telejornais e unicamente vai a trás
do seu lucro. Seja rebeliões ou incêndios...onde haja sangue aparecem, mas
pergunto há quantos anos não entram nestes bairros problemáticos e descobrem o
que por lá se passa?
Escola,
associações, limpeza, transportes, droga, saúde...
Aparecem
só na desgraça e claro como alguns partidos de extrema-direita “oportunistas”
para chamar atenção da sua própria desgraça interna que perante as sondagens
vai de mal a pior.
Vejamos,
um acto que está em investigação, muitos já condenaram sem saber as causas que
levaram a ceifar uma vida. Um condutor de cor diferente, que está nos cuidados intensivos,
mas que ninguém sabe quem é ...
Afinal estamos a falar de pobreza. Onde todos ralham e ninguém tem razão.
Se
é difícil perceber claramente o conceito de pobreza, digamos que em
Portugal a situação já foi muito pior.
Tenho
um amigo da minha geração que conta, divertido, que só percebeu que era pobre
já na adolescência. Toda a sua família e todas as pessoas com quem
convivia, amigos, vizinhos e parentes viviam da mesma forma. Portanto, somente
no liceu, ao conhecer meninos de famílias mais abastadas,
pôde comparar a maneira como vivia e tudo o que não tivera e que até então
fizera falta nenhuma. Sua avó materna até mesmo era apontada como uma mulher
" de posses" porque possuía uma vaca e vendia leite na vizinhança;
leite que ela acrescentava água para render mais. O marido da leiteira, seu
avô, tinha um chapéu e um fato já muito usado e mesmo assim era considerado um
senhor elegante.
Longe
de sermos ricos estávamos, porém, bastante acima da dita linha da pobreza.
Nunca faltou comida e a ideia que tenho é que vivíamos com conforto e alguns
pequenos luxos, como ter criadas em casa.
Porém,
a ideia de poupança sempre esteve presente. Nada era deitado fora sem que
houvesse hipótese de ser aproveitado.
A
minha tia costureira talentosa, sabia cerzir as meias e peúgas na
perfeição, sempre com a ajuda de um ovo de madeira e um dedal. Colarinho e
punhos puídos ganhavam nova vida ao serem virados e costurados novamente.
Calças
demasiado curtas viravam calções para o verão. Lençóis velhos se transformavam
em trapos para a limpeza. Restos de sabão azul e branco eram guardados até
atingir a quantidade necessária para fazer uma boa barrela.
Na
alimentação havia verdadeiros milagres gastronómicos. Restos de carne assada
surgiam em aproveitamentos como empadão ou massa de croquetes. O cozido à
portuguesa servia mais de uma refeição e terminava como sopa com o restinho das
carnes desfiada. E como era bom! Sobras de arroz invariavelmente voltavam à
mesa sob a forma de bolinhos de arroz.
Juntavam
ovos, muita salsa picada, cebola bem fininha e um pouco de farinha e eram
fritos. O pão velho ganhava vida em açordas ou rabanadas. O tio do meu
pai, Carpinteiro fez bancos em madeira para pequenada para conseguirem estar à
mesa com os crescidos. Já na escola primária os piões eram pequenas
maravilhas. Já os botões da minha tia costureira nunca tive problemas com os
botões das calças nem das camisas. Apagar as luzes ao sair da divisão da
casa é uma mania. Cresci assim. Fui educado assim. No poupar está o ganho.
Em
pequeno lembro-me de sair com a tia velha e dizer que tinha sede
e propunha comprar uma garrafa de água num café. Ela dizia sempre: bebes quando
chegares à casa. É mais barato...
Cito
um texto de Maria Filomena Mónica, no seu livro " Os Pobres" :
"
No meu caso, como na maioria das famílias de classe média urbana, os contactos
com os pobres resumiam-se às relações com as criadas que viviam em casa dos
nossos pais. De uniforme preto e avental branco com rendas, serviam os pratos
do dia como a patroa lhes tinha ensinado. Ouviam conversas íntimas, sem que
ninguém se preocupasse. Era como se não existissem. "
Conheci
uma família em que as senhoras a meio da conversa mudavam do português para o
francês. A primeira vez que presenciei a cena achei bizarro. Era em casa de um
colega de escola. E indaguei a razão; Ah, é para as criadas não
perceberem...essa gente é muito curiosa...
ESSA
GENTE...foi quando me dei conta que havia eles e os outros. E os outros
geralmente eram " essa gente".
Sempre
achei curioso o verdadeiro sistema de classes sociais em Portugal.
E
confesso que existem tantos "códigos" de postura, etiqueta e
linguagem que para um estrangeiro deve soar estranho.
Como
saber se deve dizer prenda ou presente? Vermelho ou encarnado? Magoar-se ou
aleijar-se? E se deve ou pode cumprimentar com um ou dois beijinhos?
Não
sei se estas filigranas de comportamento ou indicadores de estatuto social são
normais em todo o país ou são um fenómeno lisboeta.
A diferença de situação económica na mesma família, por vezes, ainda podia ser mais complicada que em outro tipo de relações humanas.
Igreja
Matriz de Nossa Senhora do Ó [Reveles]
A
atual igreja matriz é dedicada a Nossa Senhora do Ó, avista-se dos campos do
Mondego e do alto mar. É costume antigo os marinheiros de Buarcos, aquando da
atividade piscatória no mar alto, orientarem-se pela brancura e altivez desta
igreja e daí as promessas e pagamento após o regresso a terra.
A
paróquia foi vigariaria do Bispado, termo de Montemor, e pertence à diocese de
Coimbra, no arciprestado de Alfarelos-Soure (outrora arcediago de Penela).
É
obra antiquíssima, reedificada em 1638, incendiada em 1865 e restaurada em
1871, num momento em que foi pedido ao Seminário de Coimbra um altar livre.
A
primitiva matriz de Reveles foi a ermida de Nossa Senhora da Saúde, alada à
estrada Reveles-Quinta da Goleta (dos monges de Santa Cruz de Coimbra) e
denominada de “Nossa Senhora Velha”.
A Senhora do Ó que, no dizer de Frei Agostinho, “é
de peregrina escultura, e mediana estatura, em forma nazarena, mas em tudo
admirável que atrai a si os corações de quantos nela põem os olhos”, foi
“raptada” do seu altar há muitos anos, havendo quem afirme que a mesma imagem
existe na Igreja de Santa Maria da Alcáçova de Montemor-o-Velho, o que é
crível, pois Reveles “em tempos remotos pertenceu à freguesia de Nossa Senhora
da Alcáçova”, segundo nos informa Pinho Leal.
AS
ANTIGAS LOJAS DA FIGUEIRA DA FOZ
Hoje apeteceu-me recordar o antigo comércio da Figueira da Foz, as lojas da minha juventude!
Lembro ainda a Remacol, a Casa Oriental, a Sofico, a tabacaria Carvalheiro, a Vidraria Figueirense, os Armazéns Rodriguez, a Casa Baiana, o Moreno, a Casa que vendia loiças ao lado da casa Baiana e a Ourivesaria Álvaro Artur, hoje Ourivesaria Vaz.
Tínhamos a rua da República cheia de lojas, como a tasca do Zé da Cabaça, a Mercantil, as lojas dos irmãos Quaresma, os Armazéns de fazendas por baixo da antiga Naval e o Gracindo que foi empregado do Rodriguez e se estabeleceu na Rua da República e mais tarde teve uma sucursal na Rua Cândido dos Reis.
A barbearia Académica, do Sr. Santos, junto da Casa Rádio, a barbearia Adelino Pinto na Rua da Restauração, e outros barbeiros como o Albano, o Esteves, o Morais, o Coelho, o Guerra, o Godinho, o Evangelista, o João Ribeiro, o Matos, o Moutinho, o Salão Azul, o Silva, o Medina e o Cachulo na Praça Nova, o Morais e o Esteves na Praça Velha, e a barbearia Moderna, de António Clemente, junto do Casino.
Recordo também os cabeleireiros Moreno, Egídio, Mário Bertô, a Cecília, o Fernando, a Alice, o Né e a Olímpia.
Os vinhos e os petiscos do Gato Preto, na Rua da Alfândega, do Carvalheiro, próximo do rio, na Praça Velha, as sandes do Feteira, junto da praia da sardinha, os petiscos da Casa Papagaio, unida ao mercado, os bilhares do Café Brasil, na paragem dos autocarros, a mercearia fina do Adriano Lucas, na Praça Nova, os matraquilhos e os bilhares do Lino, junto do Casino, e a Chapelaria Moderna na esquina da Rua Direita do Monte.
A casa Nally, a Ótica Morais, a sapataria Olegna, o Bazar do Porto, o restaurante Aquário em frente ao casino, a velha pensão Europa e os seus bilhares, a pensão Paris, os bilhares do Guedes na rua Fresca, o snack bar da Sacor, a sapataria ao pé da casa Realce e eu sei lá quantas mais….
Junto do Jardim Público o Rodriguez e o Moreno cujo empregado Henrique se estabeleceu mais tarde na Rua das Flores. A seguir era a loja do Sr. Peixoto, a "Flor do Jardim", na esquina a papelaria Carvalheiro, depois, virada ao rio, a sapataria Quaresma, a Casa Baiana e logo a seguir a loja Tiago, a primeira a vender blue jeans...
Na Rua das Rosas havia a mercearia do Sr. Alfredo, na Rua Direita do Monte a Pensão Sãozinha, os supermercados OVO nas Abadias, a mercearia Evaristo na Rua da Providência, a sapataria A Elegante, a ourivesaria Campos, e eu sei lá quantas mais!
Havia muito comércio na Praça Nova, na Rua da República, na Praça Velha e no Bairro Novo, mas a casa que nunca esquecerei é a Casa Rádio, porque aqui comprei, a crédito, todos os meus livros escolares, os livros abençoados que me ajudaram a crescer e a fazer de mim quem fui e quem sou!
Por detrás dos balcões havia gente educada e simpática, que fidelizava clientes, como os senhores Ângelo, Valdemar e Joaquim, os três da Casa Rádio, o Sr. Lino do Nicola e da casa de bilhares, a dona da Casa Guimarães, a Ana da Tabacaria Africana, a Maria Helena da Casa Havanesa, o Sr. Cardoso e a Lidinha da Nally, o Sr. Carlos Antunes da mercearia Flor do Mondego, os manos Cordeiro da Casa Salgueiro e tantos outros que não me recordo ou não conheci.
FOI
EM SETEMBRO
[19
anos?! Sério?! Parabéns, amores da minha vida]
Meninos
de olhos bonitos, sorrisos rasgados e abraços apertados. De amor sem medida.
Meninos
de olhar doce, meigo e palavras carinhosas. De sentimentos puros. De paixão
pela vida.
Mais
um ano que se completa. E o meu coração aperta. O medo aumenta. Desde o momento
em que nasceram o mundo ganhou novas cores e sabores. Tornou-se mais bonito e
brilhante.
O
vosso olhar curioso e cheio de vida revelou desde sempre uma alma destemida,
sempre disposta a explorar o mundo e a enfrentar cada obstáculo.
O
vosso sorriso rasgado, aquele que ilumina até os meus dias mais sombrios, tem o
poder de transformar qualquer instante num momento mágico. A forma como
sorriem, me abraçam e me dizem “gosto de ti”, “amo-te” ou me chamam apenas
“amor da minha vida” enche-me de esperança. De ternura. De amor.
Meninos
apaixonados pela vida, com um coração que transborda carinho. Com um amor que
me enche de vida. Que me dá forças e me faz continuar quando me apetece
desistir.
Tão
diferentes. Tão iguais. Quem vos vê apenas notará as diferenças. Cabelo louro
ou castanho. Olhos azuis ou castanhos. Mais alto ou mais baixo. Jamais verão o
que eu vejo. Jamais saberão o que eu sei. O que eu sinto. E sinto tanto.
Meninos
de olhos bonitos, sorrisos rasgados e abraços apertados, que continuem a
crescer e a me ajudar a ver a vida com outros olhos. Permitam-me continuar ao
vosso lado a ver-vos crescer. Ver-vos continuar a lutar pelos vossos sonhos. A
amparar-vos a cada e a ajudar a levantar.
Que
nunca falte no vosso coração o carinho que compartilham com todos e a coragem
para serem autênticos, para lutarem pelos vossos sonhos e vencerem os
obstáculos.
Meninos
de olhar ternurento e coração bonito, que o ano que agora começa seja o ano da
vossa vida. Que vos dê tudo o que desejam. Eu vou estar, sempre, aqui a torcer
por vocês até ao meu último suspiro!
Muitos
parabéns, amores da minha vida, sejam felizes.
•
“Só
vivemos uma vez não vivam em vão!” - este seria o único conselho que vos daria
se me pedissem, não deixem a vida passar sem que tenha significado!
•
Vocês
são, sem dúvida, o melhor de mim.
17ª Edição das Palavras
Andarilhas
Noite de contos no
Auditório do Coreto
José Craveiro (PT)
Beja, cidade dos contos
30 de Agosto a 1 de
Setembro
A festa da palavra
contada
Repórter
Mabor (1960) Vai resistindo como se fosse uma criança que brincava com a bexiga
do porco, qual bola que só rebentava nas silvas do caminho de carros de vacas,
no Casal Novo do Rio, já lã vão70 anos!
Demasiado
belo ao sentir essa leveza, quando perante a morte do Carlos Simão, esta manhã
na Cova Gala, reconheci que a "besta "por mim suportada nas
mesquinhices da vida, não tem comparação com aquela inocência perdida e de
repente ressuscitada como se fosse milagre em que não acredito.
Remorsos
e medo da morte?
Muitos
se enganam nas vossas cogitações, não é por aí a minha inquietação. O que
lamento no meu longo caminho da vida, foi ter-me iludido e desvalorizado a
essência e o brilho de vivermos em paz com os outros, chutando na bexiga de
porco como se continuasse a ser criança, quando esta manhã fiz uma viagem ao
passado na Cova Gala, tão doce e tranquila, pese embora a morte do Carlos
Simão, se reconheço que na lei da natureza será sempre dor e necessária.
DEDICO
AOS MEUS MENINOS DO 5º ANO
Crónicas
de Viagem
O
VELHO CHAPÉU DO TI ARISTIDES
(história
de muito amor)
Aristides
era um velhote da minha infância. Na aldeia era conhecido pelo Tistides. A
grande recordação que tenho dele, entre muitas, era beber uns copos na loja do
Ti Alma de Deus e andar com um velho chapéu roto que não era só um chapéu. Mais
ou menos pelo tempo das sementeiras, era um chapéu roto pequeno. Pelo S. João
era outro chapéu roto um bocadito maior. No pino do verão, o chapéu era roto,
mas grande. Mas, era sempre um chapéu roto.
Nunca
vi a parte de cima da cabeça do Tistides. Nem eu, nem ninguém na minha aldeia.
Era o nosso enigma de cachopos desalmados para as tropelias. Chegámos a dar um
empurrão no velhote, no meio das nossas brincadeiras, enquanto ele passava pela
Cheira (o nosso estádio com balizas entre as árvores e a barroca como linha
final). Eu empurrei o Zé Alberto e o Toné Pinto, que fingiram desequilibrar-se
e ir de encontro à criatura.
Nada!
O chapéu parecia colado à cabeça. Os chapéus, pois ciclicamente iam mudando.
Adivinhas
daqui hipóteses dali, apostas dacolá, ninguém sabia porque mudava o velho o
artefacto que lhe cobria a cabeça que não via água desde que nascera. E, sempre
a mesma ordem na troca: chapéu pequeno, chapéu médio e chapéu grande. Sempre
sebentos, a pobreza era assim: pobres, mas honrados!
O
Tistides, para nós era um velhote muito velho. Hoje, falamos disso e pensamos
que ele teria a idade que temos hoje. Sempre quisemos saber para que nos pedia
os restos do pão com manteiga ou de marmelada que cada um levava. Claro,
chegámos a levar um ou dois pães a mais, pois pensávamos que seria para lhe
matar a fome.
Claro,
a pobreza, a miséria e as desgraças da vida levaram o Tistides. Nós, os
cachopos, é que descobrimos. Ele há três dias que não parava, meio afastado, na
Cheira para ver as nossas jogatanas, Gostávamos dele!
Naquela
tarde, após reunião geral da cachopada, éramos oito, decidimos que iriamos
entrar pelas traseiras do casebre daquela alma. Deitadas as sortes, lá fui eu
com o Mi Primo Berto, enquanto os outros se esconderam atrás da silveira, por
detrás da casa do pobre homem. Com a coragem que os oito anos nos dá, entrámos,
com muito medo, não fora aquela personagem enigmática, mas na qual percebíamos
carinho, amor e ternura, dar-nos uma bordoada.
Entrámos
como raposas à caça e saímos como um cão danado a quem todos apedrejam: a
correr e a gritar.
O
Tistides estava quieto e calado para sempre na cama. Virou uma estrelinha, como
diziam as nossas avós.
Com
muito medo mascarado de coragem, lá fomos todos. Há momentos que ninguém
consegue explicar. O Tonho Botelho, mais corajoso, com o medo que todos
tínhamos de mexer em quem não se movimenta, tirou o chapéu todo cheio de nódoas
do nosso amigo. Naquela altura, era a versão mais pequena dos três que usava.
Lá
dentro, meio adormecidos pela fome de já três dias, estavam três gatinhos que
já nem miar conseguiam. Alguns foram buscar pão com manteiga a casa, outro foi
buscar água e eu e o Zé Alberto fomos avisar o Doutor Martins.
No
quintal do Tistides, lugar inacessível para qualquer ser humano, estavam a
miar, como quem chora, sete gatos. Eram os que decidiram ficar por ali. Os
outros, muitos, que o Tistides ia criando e transportando nos seus velhos
chapéus enquanto cresciam, andavam à solta.
Hoje,
tenho sete gatos e tenho recordações profundas dos meus grandes amigos, destes
meus grandes amigos, e da pobreza que havia há sessenta anos, no meio de muita
honra, trabalho e solidariedade entre gente “pobre, mas honesta”, como dizia
Meu Avô Santiago!
Foi
longa a caminhada.
Sinuoso
o caminho,
cada
vez mais distante,
inacessível
o fim da estrada.
Ao
longe era o céu,
o
infinito, azulando meu ser perdido na jornada.
Brumosas,
as manhãs
ocultavam
as promessas
radiosas
… onde o limite
era
o infinito.
Envoltos
em densa névoa,
soavam
agora
perdidos
os meus sonhos,
perdidamente
distantes,
perdidos
de mim
perdida
eu deles também …
Cada
vez mais distante,
hesitante
ainda,
avisto,
rompendo a névoa,
o
acenar frouxo
de
um tempo que não foi,
dos
momentos perdidos,
dos
enganos aceites
leviana
e confiadamente
desse
amor traiçoeiro …
Ainda
sorridente dos sonhos, à espera da luz
desta
vida que foge
e
escurece entristecida
no
alvorecer de cada manhã promissora.
Velha, eu?
Sim… já um pouco velha
em idade, mas é a lei natural da vida…!
Sinto-me grata por
envelhecer, sentir que os anos vão passando …
Tudo tem a sua idade, o
seu tempo…
ser bebé,
ser criança,
ser adolescente,
ser jovem,
ser adulta,
ser trintona,
ser quarentona,
ser cinquentona…
ser sessentona…e o
envelhecer não pára!
Velha, eu?
Sim… envelheço cada dia
que vai passando, sentindo-me em cada segundo da vida a mulher mais incrível,
maravilhosa e única!
Sim, única, porque me
respeito e amo, não tenho vergonha, nem de mim, nem do meu corpo.
Sou eu…e só eu… linda,
bela, cheirosa, vaidosa, tenha os anos que tiver, esses anos vão abraçar-me…há
que viver o dia a dia, desfrutando das qualidades e virtudes, melhorando o que
é menos bom!
Viver…e ser FELIZ!
Obrigada aos meus
filhos João Capinha e Joana Capinha.
Obrigada ao meu
companheiro de viagem, meu marido Capinha Lopes.
Vos amo!
Hoje, faço 60 anos!
Velha, eu?
"Cantinho literário"
Era
uma vez…uma notícia
Era
uma vez a Humanidade que crescia de forma alucinada e desenfreada num Planeta
chamado Terra.
Os
primeiros habitantes viveram felizes na sua Vida difícil, mas feliz de busca
pela sobrevivência. Avanços da Medicina concretizaram uma maior longevidade e
consequentemente um aumento da população Mundial. A busca incessante pela
sobrevivência levou certos povos a alimentarem –se de tudo o que é ser vivo. A
juntar a esta luta pela sobrevivência, condições económicas desfavoráveis fazem
parte da vida quotidiana de vários povos.
O
ano de 2019 termina com uma ameaça global de um vírus mortal e contagioso. Há
semelhança de tudo, pensa-se sempre que apenas acontece aos outros. Mas não!
Essa realidade chega a Portugal no dia 2 de Março. O País fica em estado de
alerta e a 17 de Março 2020 é decretado o primeiro estado de emergência.
Com
o isolamento social as pessoas reinventam –se: meios de comunicação como a
internet que até aqui distraiam e afastavam as pessoas, agora aproximam –nas.
Um admirável mundo novo tecnológico ao serviço do trabalho e da comunicação
entre as pessoas. Também a família nunca esteve tão próxima e a palavra
«solidariedade» deixou de ser uma palavra vã e nunca teve tanto sentido
Os
sobreviventes decerto que terão grandes histórias para a História contar.
Ninguém
sabe como será o seu final, mas todos /as esperamos que tenha um final feliz!
PARA LÁ DOS SONHOS
Milagres na nossa vida
Acontecem todos os dias
Sempre que abrimos os
olhos
Despertamos novamente
De um sono imenso e
profundo
Que nos leva para lá de
nós
Nos leva para lá do
mundo…
Que mundos habitaremos?
Quando estamos
adormecidos?
Para onde foge a nossa
alma?
Para onde vão os
sentidos?
De onde regressamos?
Às vezes em aflição?
Outras vezes tão
felizes,
Que nem queremos
acordar,
De um sonho profundo e
belo
Que nos enche de
emoção?
Que o encanto perdure,
Bem dentro do
coração!...
Para lá dessa lonjura…
Onde esteve a nossa
alma?
Com quem falou e viveu
Momentos inesquecíveis?
Que doce recordação!…
Estava tão bom esse
sonho
Mas porque acordar
agora?
É que agora regressados
Brota em jorros a
emoção
As palavras
estranguladas
Sobem pela nossa
garganta
Diretas ao coração…
Para lá dos nossos
sonhos
Há um mundo de magia
Há rostos e sentimentos
Encontros e
desencontros
Já repetidos na vida…
E retomados qualquer
dia?
Refúgio
Pedi para ficar
Onde o vento não ousa,
Onde o verde repousa,
Onde o ar acaricia….
Pedi para ficar
Longe do clamor do mar
Num céu de azul sem par
Onde o sol alicia…
E nesta paragem ficarei
Até que seque a semente do medo
Lastro inútil que carrego há anos,
Noite eterna do meu degredo
E nesta paragem ficarei
Até que o verde, faça verde o meu olhar
Até que o silêncio entorne a minha alma
E nela me possa deitar…
LIVROS
Há vidas que encerram
muitas vidas e, nessa multiplicidade, condensam a História de um país. Eis a
marca do percurso cívico, político e literário de Manuel Alegre, sublinhado
agora pela publicação das suas memórias. Ao correr da página, sem plano predefinido
ou notas acumuladas ao longo dos anos, o poeta, autor de um dos livros mais
emblemáticos do século XX, Praça da Canção, viaja pela sua vida, desde a
infância até à atualidade, da influência dos seus ascendentes (liberais e
republicanos, miguelistas e monárquicos) às suas candidaturas à Presidência da
República. Pelo meio, o seu papel ativo (e decisivo) na luta contra o Estado
Novo, incluindo em Angola, durante a Guerra Colonial, e em Argel, aos
microfones da rádio Voz da Liberdade, assim como a vivência do 25 de Abril e a
construção da democracia. Um relato único, também pela simplicidade e pelo
apuro da sua composição, feito de inúmeros protagonistas, histórias, ousadias e
com uma inquebrantável coragem.
MÚSICA/POEMAS
Estrela Da Tarde |
Poema de Ary dos Santos